A regra da razão e as condutas per se
A chamada regra da razão foi desenvolvida no direito americano, em razão da amplitude das restrições constantes do Sherman Act, visando flexibilizar as suas disposições, com o que equivaleria, no direito brasileiro, à aplicação ao caso concreto dos princípios da razoabilidade ou proporcionalidade.
Paralelamente, elaborou-se também o princípio per se condemnation, no sentido oposto, no qual certos acordos não poderiam ser razoavelmente justificados, ou seja, seriam ilegais per se, bastando a prova da sua ocorrência, sem a preocupação com o eventual objetivo das partes ou dos efeitos sobre o mercado, não sendo possível aplicar-lhes a regra da razão, a exemplo de condutas como a fixação de preços, acordos entre licitantes, divisão de mercados entre concorrentes.
Quanto ao tema, Neide Teresinha Malard defende que a adoção de um sistema misto, que congregasse a segurança jurídica à flexibilidade necessária à aplicação eficaz da Lei, talvez fosse a solução mais adequada, a exemplo da alternativa buscada pelo legislador mexicano. Contudo, no caso brasileiro, conforme a Lei nº 8.884/94 não existem condutas per se, em razão do disposto nos artigos 20 e 21 já referidos, pois a conduta potencialmente danosa ao mercado deve ter alguma probabilidade de causar danos adversos à concorrência, já que, de outro modo, não terá objeto anticoncorrencial, ainda que tipificada no art. 21, existindo, assim, uma relação de reciprocidade entre o objeto, conteúdo da conduta, e os efeitos.
Não há que se falar, portanto, em conduta ilícita per se no direito brasileiro, pois sempre será necessário analisar os seus efeitos no mercado.
Se tais efeitos forem inexpressivos, a questão deve ser resolvida no âmbito da responsabilidade contratual ou civil, ou mesmo sob a ótica do consumidor, mas não pelo direito concorrencial.
É importante ressaltarmos, neste ponto, que, do ponto de vista concorrencial, a existência de estruturas concentradas de mercado, como monopólios ou oligopólios não é ilegal em si, o que ocorre é uma maior probabilidade, nesses casos, de exercício de poder de mercado, ampliando o potencial de ocorrência de condutas anticompetitivas.
Como bem esclarecido no Anexo da Resolução CADE nº 20/99:
“A análise de condutas anticoncorrenciais exige exame criterioso dos efeitos das diferentes condutas sobre os mercados à luz dos artigos 20 e 21 da Lei 8884/94. As experiências nacional e internacional revelam a necessidade de se levar em conta o contexto específico em que cada prática ocorre e sua razoabilidade econômica. Assim, é preciso considerar não apenas os custos decorrentes do impacto, mas também o conjunto de eventuais benefícios dela decorrentes de forma a apurar seus efeitos líquidos sobre o mercado e o consumidor.”